sexta-feira, janeiro 23

Crítica: Amor, Plástico e Barulho (2013)



Por Wendell Marcel

"Cinema que se repete"

O que sabemos sobre a arte cinematográfica é que a cada novo filme, o diretor, muitas vezes inconscientemente, realiza releituras de outros filmes para construir o seu próprio material audiovisual. Algumas pessoas repetem isso como um grande clichê na narrativa. No caso de Amor, Plástico e Barulho, o primeiro longa-metragem da diretora Renata Pinheiro, percebemos o jogo dramático presente em clássicos como A Malvada, onde uma mulher que admira o trabalho de uma grande estrela da Broadway termina por tomar o seu lugar nos holofotes da fama, de uma maneira sorrateira e munida de seus atributos sobretudo estéticos e sensuais. Neste filme pernambucano não é diferente. Jaqueline e Shelly estão, no início do filme, em posições diferentes: enquanto a primeira já alcançou o seu lugar ao sol, a outra ainda está sob a sombra da mesma. A transformação nessa posição social das personagens ocorre quando Shelly, num impulso de crise dramática, compra uma tinta de cabelo na cor loira. Nesse momento ocorre a diferenciação entre as duas.

A música brega está aqui fortemente presente na narrativa do filme, quando algumas músicas são diálogos das personagens, dando a entender de que esse estilo faz parte da vida das pessoas no nordeste brasileiro. Aqui encontramos uma crítica muito interessante sobre a representação que a música brega, e seus produtos relacionados, são vistos por outras regiões do país: um barulho. Ora, o que conhecemos por música é que precisamente a canção e a letra precisam estar sonoramente compatíveis. Dessa forma, o estilo musical brega é música como qualquer outra, e quando a letra "Chupa que é de Uva" é cantada lentamente e de forma dramática pela personagem Jaqueline, reconhecemos que a própria música popular brasileira sofre um padrão relacionado a interpretação das canções. Música de qualidade? O roteiro, nesse sentido, levanta algumas questões acerca da cultura da música, neste caso o brega, que está ligado a um comportamento mais agitado, de contato, ligado mais a paixão, localizado tanto no litoral do nordeste brasileiro, quanto no interior de Pernambuco. Essa temática foi apresentada de forma muito eficiente no documentário Faço de Mim o que Quero, curta-metragem premiado de Sérgio Oliveira e Petrônio Lorena. Ambos os filmes retratam que o brega é vendido nas ruas, em feiras livres.

Em uma certa cena de Amor, Plástico e Barulho, uma personagem comenta sobre a metáfora do copo de plástico. Assim, entramos no conceito de plástico. Por ser um material de composição, muitas vezes reutilizável, o plástico no filme é compreendido como um momento passageiro, e que se repete a cada novo início, além de ser a busca pela fama, o reconhecimento dela seguido pelo término repentino e abrupto. A plasticidade da música brega, quando a cada novo instante novos talentos aparecem, para fazer girar a máquina da indústria cultural, deixa para trás as vozes que antes faziam gritar dezenas de fãs nos programas de tv, ou como mostrado no filme, em locais como a Companhia do Amor. 

O amor aqui está relacionado ao contato humano, presente em muitas canções da música brega, mas também, metaforicamente, plástico nas relações humanas, como infere os relacionamentos amorosos das personagens no filme. Estão imbricados os conceitos de amor (quem sabe não seria mais paixão), plástico (a fama, os CDs vendidos nas feiras livres de Pernambuco juntamente com outros plásticos domésticos) e barulho (a música envolvente, que faz corpos se unirem na pista de dança, e que leva a outra cena que envolve sexo e, amor...). A plastificação da imagem é a todo o momento revisitada no filme. Muito brilho na tela, edição que provoca a fusão de cenas interligadas.

Por outro lado, como reconhecido no cinema brasileiro, o roteiro peca em alguns aspectos. O jogo dramático entre as personagens é fraco, colocando cada cena por sua conta na admissão de mais imagem e menos texto trabalhado. Ainda que exista a construção de duas personagens que estão em estados psicológicos diferentes no percurso dramático, o conflito não atinge uma qualidade no final do segundo ato, fazendo com que o clímax não alcance uma força interessante. No roteiro, em algumas cenas a microestrutura não é bem desenvolvida, dificultando uma empatia com as próximas sequências de cenas. Contudo, esse problema não prejudica o entendimento da obra como um todo, pois a investigação da diretora sobre a cultura musical, os padrões de beleza, os sentidos urbanos que Recife está passando com a construção de prédios cada vez mais altos e complexos estruturais nas zonas próximas ao litoral, provoca discussões muito pertinentes, que são aliás de cunho social e político. 

Nota: 6,5-10

Trailer:


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