sábado, abril 26

Crítica: O Pagador de Promessas (1962)


Por Wendell Marcel


"Um clássico do cinema brasileiro".

O diretor brasileiro Anselmo Duarte foi a Cannes, em 1962, e levou para casa a Palma de Ouro pelo seu filme de maior sucesso nacional e internacional, O Pagador de Promessas, uma adaptação da peça teatral de Dias Gomes. Na ocasião da premiação, derrotou dois grandes filmes do cinema mexicano e italiano, as obras-primas O Anjo Exterminador (de Luís Buñuel) e O Eclipse (de Michelangelo Antonioni). O longa-metragem de Anselmo Duarte também foi indicado ao Oscar no ano seguinte, perdendo na categoria de Melhor Filme Estrangeiro para uma película francesa. Ora, o histórico estrelar de O Pagador é reflexo do poder cinematográfico e de linguagem visual, fruto de uma visão instrumental e poética de Cinema do seu realizador, que começou como ator na pornochanchada, atuando já no final dos anos 50 como ator e diretor. Ocasionalmente, o nome de Duarte é mencionado como um dos maiores cineastas brasileiros de todos os tempos; àquele o qual fez abrir as portas para grandes estrelas da televisão e do cinema, nas décadas seguintes ao O Pagador, como Norma Bengell, Glória Menezes e Leonardo Villar. Um fato é certo, a década de 60 no Brasil foi o boom cinematográfico, onde nomes como os de Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos (bem antes, em 1954, filma Rio 40 Graus, um marco e precursor do Cinema Novo), Ruy Guerra, Joaquim Pedro de Andrade, Trigueirinho Neto entre outros tomaram a tela da projeção com toda a força de suas produções. Com Anselmo Duarte, assim, dar-se o impulso no novo cinema brasileiro: o social, o econômico, o da cultura, o da inteligência cinematográfica no copião e na tela.

A peça de Dias Gomes foi encenada pela primeira vez em 1960, no Teatro Brasileiro de Comédia de São Paulo, e para o dramaturgo, o texto retrata "a história de um homem que não quis ceder e foi destruído". O roteiro de Duarte, que opta por adicionar novos cenários (a exemplo do hotel onde Rosa supostamente traíra Zé do Burro com o garanhão da região, Bonitão; o jornal; a sala onde os profissionais da Igreja se reúnem e o prólogo do filme) amenizam o impacto da representação da escadaria como um organismo vivo, onde os personagens se "mostram", apresentam-se ao espectador com os defeitos de caráter; em síntese, o local da ação dos personagens, que põe no ringue ideológico o homem do interior com os sujeitos da cidade, não diminuem o impacto da obra. O padrinho de François Truffaut, o teórico e crítico de cinema André Bazin, acerca do teatro e do cinema, vai dizer que "ou o filme é a pura e simples fotografia da peça (logo, com seu texto), e é precisamente o famoso 'teatro filmado', ou a peça é adaptada às 'exigências da arte cinematográfica'". Portanto, Anselmo Duarte ao adaptar a obra teatral de Dias Gomes, ao passo que não subverte a história e os diálogos, promove a passagem do texto para o cinema através da linguagem cinematográfica. Não vi a peça encenada, mas ver o texto original adaptado e filmado para o cinema, é sobretudo dilacerante. Pois, nem sempre o cinema diminui o texto teatral, vide Tennessee Williams e William Shakespeare.

No filme, a escadaria, atente, tão usada no kinema como proposta de significar um sentido trágico, inserido no macrocosmo da cidade (solidão, violência), é a eterna via crucis do homem e da mulher: entre o bar (em frente a escadaria, um antro de perdição, de pecado) e a igreja (no final da escadaria, um lugar ao sol, o local da salvação) fica Zé do Burro, submergindo ao "inferno", onde residem os mal-feitores, os imorais, a ação dramática do "pecado"; emergindo ao céu, que o filme critica como uma representação indissociável da categoria de santidade e pureza. Ele está, portanto, no purgatório, posicionando-se ao julgamento de ambos os homens e mulheres, e do divino. Tão logo os personagens do "local da salvação" e do "antro de perdição", eles passeiam sem nenhum desdem pela escadaria. Zé do Burro pouco faz isso, submergindo para salvar os seus, a sua mulher; para ele o inferno está no lugar do céu, o demônio no lugar dos santos. Ele não é burro, é sim ingênuo. Então, quem são os burros? O Bonitão? Marly? O padre? O jornalista? 

Percebe-se a dissonância cegante da influência da cidade como um agente de transformação. Que grupo seria mais manipulador de discursos do que os jornalistas, interpelados pelo diretor do filme na posição de que a chapa é também, assim como o texto escrito, as palavras ditas, singulares movimentos inconstantes de transfiguração mediante a erraticidade dos ouvintes, dos leitores, dos personagens da vida real? Apresenta-se a fonte estética de Billy Wilder que Anselmo Duarte, ao ler Dias Gomes, bebeu em A Montanha dos Sete Abutres. Acerca disso, a peça de Nelson Rodrigues, possivelmente, recorre a Wilder, a Gomes, e escreve O Beijo no Asfalto; enquanto que sua adaptação anos mais tarde, recorre a Duarte. É a influência pela influência, a fonte para a criação. As artes se completam, é certo, consubstanciam-se. Conclui-se que os barganhos estéticos e da linguagem no cinema brasileiro são imensuráveis em O Pagador de Promessas, como o imperioso enredo, discretamente engajado no guião de A Marvada Carne, ou no simpático Tapete Vermelho, de Luiz Alberto Pereira, décadas mais tarde.

A fé, a segregação religiosa, o sincretismo cultural. Ganchos constitutivos para compor uma obra-prima. Cenas marcantes do filme continuam na mente, é de pele; o espectador é um sobrevivente ao término da sessão. O padre enlouquecido pelo som dos berimbaus, desenfreia um combate de gladiadores no campo das dúvidas ao bater nos sinos. As categorias de tempo e espaço, principalmente o primeiro, através da montagem, figuram para que o espectador esteja mais próximo de Zé do Burro. Uma teia psicológica é criada, não tem como fugir da escadaria; do medo de não concluir a promessa; da culpa de ter traído o marido; de não ser amada por um vigarista; de subjugar um pobre coitado pagador de promessas.

O real reproduzido no filme (os produtos que ele oferece, como: personagens, enredo, ideal de assimilação) é captado pelo espectador, afetando os seus sentimentos e adquirindo uma significação ideológica. Ora, não precisei ser católico, ser umbanda, ser candomblé ou ser agnóstico, como Duarte o foi, para poder falar com o filme. Senti-lo. Esses três processos estão claramente bem trabalhados na construção de roteiro, enquanto são pensadas pelo diretor, a linguagem para torná-lo um quadro. No ápice, bastou o dedilhar do berimbau, para que Cannes se curvasse ao filme. É isso, é um quadro que explode na tela. Basta a desolação harmoniosa de Rosa, nos planos abertos, solitários, mostrando o quão pequenos somos na arquitetura da construção de ideias e crenças; os engenheiros que tentam imputá-las são destruídos. Por que as ideias e as crenças, podem nos fortalecer ou nos destruir. 

Nota: 9,0/10,0



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domingo, abril 20

Crítica: Noé (2014)


Por Maurício Owada

"A vontade do homem e a vontade de Deus"

A polêmica acerca de um trabalho que remete a Bíblia iniciou não através do fato de ser uma releitura, mas sim pelo fato de Darren Aronofsky ser o idealizador disso (baseado em um poema feito quando criança), o que levou as pessoas a acreditarem que a história de Noé tomaria um tratamento diferente, senão totalmente oposta do que a mensagem da Bíblia passa. Assim como Martin Scorsese colocou com maturidade em A Última Tentação de Cristo (The Last Temptation of Christ, 1988), aonde um Jesus ficava dividido entre a alma do Messias e a carne na Terra que ansiava os prazeres das pessoas comuns, sejam carnais ou espirituais (que causa uma grande e interessantíssima discussão de nós acerca da espiritualidade e do corpo), aqui a missão é de um homem comum que lida com decisões importantes e de grandes consequências, para levar adiante a vontade do Criador (jamais mencionado como Deus) de se fazer uma arca para fazer sobreviver todas as espécies da Terra para o Dilúvio vir, "limpar" e dar espaço para um recomeço.

Aronofsky trás a tona detalhes que são pouco detalhados na Bíblia ou na forma como é nos contada (não sou grande conhecedor das antigas escrituras, só pra ficar claro qualquer ignorância do que recitarei), como um mundo verdadeiramente violento, aonde existe um rei, mas seu discurso de livre-arbítrio toma um rumo interessante, ainda que pouco discutida ou aprofundada, apenas solta nas palavras do vilão Tubalcaim (Ray Winstone), que vem da linhagem de Caim, que o põe como contra-ponto de Noé (Russell Crowe), da linhagem de Set (o outro filho de Adão e Eva). O mundo aonde a vontade do homem é a lei remete a uma sociedade anárquica (não confundir com anarquismo), levando a um caos profundo, aonde o egoísmo e a ambição falam mais alto. É essa reciprocidade de convivência que falta ao mundo que leva Noé a ser um homem praticamente refugiado da civilização, pela incompatibilidade com a desgraça acerca do que o ser humano comete.

Ateu, Aronofsky trata a história do Dilúvio como uma mitologia do modo como certos elementos que são alterados, como os anjos-caídos serem os guardiões, banidos na Terra, que se transformou num inferno (estão disponibilizadas interpretações infinitas, fiquem à vontade!) por ajudarem os humanos na construção da civilização e depois caçados por aqueles que ajudaram, que lembra Prometeu, banido por Zeus a ficar amarrado numa rocha por toda a eternidade, enquanto uma águia devorava seu fígado todos os dias, que regenerava para ser devorado novamente, numa dor eterna, por roubar o fogo do Deus do Olimpo e ter dado a humanidade, e são essas releituras de certos aspectos culturais influenciadas por outras que leva o filme a uma expansão mais universal, até quando se aborda a questão da presença maior do Criador aos humanos, quando Noé fala da criação e na tela, transparece (num exercício totalmente visual e belíssimo, típico de seus filmes com virtuosismos técnicos como frames rápidos para contar algo extenso em segundos) o Big Bang até a evolução das espécies, mostrando que ciência e religião são apenas dois meios diferentes de se contar uma mesma história. Não é a busca de uma releitura que cause polêmica que Darren Aronofsky trás, mas sim uma releitura que nos faça refletir sobre nossa própria cultura judaico-cristã, embutidas nas escrituras sagradas ocidentais, ainda que dialogue mais com o Ocidente todos os elementos presentes, inseridos ou modificados.

Mas a grande mensagem é a humanidade, como a forma de nos manifestarmos como uma espécie que carrega a alma, que possui a vontade e o próprio para caminhar, que contradiz com o argumento de que tudo está escrito ou destinado, Noé carrega tudo isso e fazê-lo passar por um homem que mataria uma criança para não falhar com Ele põe uma profundidade enorme sobre a vontade de Deus e a vontade do homem, que sempre entrará em conflito, pois as ânsias dos seres humanos vai além da plenitude espiritual, independente da religião, já que o budismo também prega isso. O que move o homem? O dever ou a consciência? Ou uma leva a outra? Seria Ele falando conosco através de sinais ou nós interpretamos tudo nas entrelinhas? A manifestação do Criador através de sonhos e da natureza tira a voz grossa e austera de outros filmes para algo além da matéria e da alma. Mas a concepção dele também é questionada, deixando a dúvida de que modo podemos representá-lo. Dentro da diegese do filme, Deus existe, mas o tom bastante fantasioso que o diretor emprega põe a religião como algo que poderá se transformar em mitologia.

Atingindo um público consideravelmente amplo para um tema delicado, levando em conta as crenças do mundo de hoje, aonde o fundamentalismo anda mais presente devido ao mundo de hoje, que independente de crer ou não, está mais violento (ou ela está maior divulgada? O mundo está mais aberto para as coisas ruins afora?), levando pessoas a acreditarem em discursos quase sensacionalistas, prevendo o apocalipse de forma catártica contra a corrupção dos seres humanos, um novo Dilúvio. Mas se você percebeu várias interrogações neste texto ou afirmações duvidosas, pare para pensar que tanto este texto redigido, assim como uma escritura que carrega uma fonte inesgotável para diversas culturas do mundo, já que a Bíblia não é a única que manifesta uma crença, mas também o Alcorão, o Torá etc, ambos são letras e palavras combinadas que passam uma tese, um manifesto, uma opinião ou um questionamento, que podem sim, de toda forma, serem questionadas, independente de sua importância na religião e na história, escritas por homens. Concorda?

*Não se pode esquecer o grande desempenho do elenco, não apenas o protagonista, mas também os coadjuvantes formados por Jennifer Connely, Emma Watson, Anthony Hopkins, Logan Lerman e outros. Não entrou no texto "oficial" devido ao conteúdo que abordava mais a discussão que a obra trazia. Além da genial trilha-sonora de Clint Mansell que trás algo antigo e o revisita em faixas belíssimas para o filme, que lembra também a beleza de Peter Gabriel em A Última Tentação de Cristo.

Nota: 8,0/10,0




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sexta-feira, abril 18

Sessão Curta+: Di Cavalcanti (1977)


Filme: Di Cavalcanti ou Ninguém Assistiu ao Formidável Enterro de Sua Última Quimera; Somente a Ingratidão, Essa Pantera, Foi Tua Companheira Inseparável
Direção: Glauber Rocha
Roteiro: Glauber Rocha
Gênero: Documentário
Origem: Brasil
Duração: 15 minutos
Prêmios: Prêmio Especial do Júri - Curta Metragem no Festival de Cannes 1977
Sipnose: Polêmico curta que acompanha o velório e enterro do pintor brasileiro Emiliano Di Cavalcanti, com uma câmera e uma idéia (discutível) na cabeça. Glauber filmou o corpo no caixão, o enterro do caixão ao som de "Umbarauma, Homem Gol" de Jorge Ben Jor.

*Dica: aperta no item da lateral do vídeo para expandir a imagem.

Filme:

segunda-feira, abril 14

Crítica: Terra em Transe (1967)


Por Maurício Owada

"A alegoria política de Glauber Rocha"

Sempre conhecido por um cinema engajado artisticamente e politicamente, Glauber Rocha não utilizava de manipulação, mas tornava o filme interpretável para qualquer época que se assistisse, assim é o curta em documentário Maranhão 66 (assistam aqui!), quando o registro da posse de José Sarney, se ele denunciava os males do Estado que precisavam de atenção, vendo sob a ótica de hoje, o cinismo e a demagogia do discurso do novo governador que arrancava do poder uma antiga oligarquia para colocar a própria se torna evidente e numa entrevista, o diretor dizia que todo cineasta tem que ter um pouco de profeta. A obra não foi utilizada para fim de propaganda, não sendo utilizada na campanha, mas ficou eternizada no cinema como um produto audiovisual que demonstrava o talento e o olhar impar do cineasta baiano.

Após fazer filmes como Barravento e Deus e o Diabo na Terra do Sol (o contraponto na filmografia do cineasta: um filme que se passa a beira do mar e outro no sertão árido, mas com problemas e questões sociais semelhantes), Terra em Transe não sai do Brasil alegoricamente, mas Glauber cria um país imaginário - Eldorado - e se situa na província fictícia de Alecrim, aonde um governador populista ganha apoio com ideias quase revolucionárias, mas quando chega ao poder, repreende os camponeses em prol dos grandes burgueses que alimentam o governo, inspirado claramente em Sarney e que reflete outros grandes líderes populares de hoje em dia, a obra se abre como uma alegoria da situação política e social do Brasil e do restante da América Latina, que sofria com as políticas desiguais e o intervencionismo americano em prol de uma relação não só apenas ideológica, como econômica, sendo que o menor sinal de "ato comunista" levou o país a ser tomado pelos militares em 1964.

O filme foi confuso para os militantes na época, que não sabiam se Glauber tinha feito um filme de esquerda ou direita e tentar vê-lo por uma ótica de posição e ideologia política determinada é desmerecer toda a discussão que ele põe na tela, que irradia poesia pelas imagens poderosas e pela quebra de estética que ele leva junto com a transgressão do próprio conteúdo. Os diálogos são clamados em muitos momentos, as atuações teatrais e trás uma modernidade dentro do filme de forma ainda incrivel, pois irradia uma energia de dentro daquele discurso de revolução, sangue e palavras. O filme quebra paradigmas da linguagem de romper com o convencional em todos os sentidos e assim era o cinema dele.

Como dito por Martin Scorsese em uma entrevista sobre Rocha, Terra em Transe é um cinema político, mas envolve os seres humanos que fazem parte do processo - ele não trás nomes importantes, mas cada personagem representa um papel dentro de um momento de repressão, pobreza e rebelião. O personagem Paulo Martins, um jornalista e poeta que se engaja politicamente e se divide entre um lado e outro, interpretado por Jardel Filho é o papel de Glauber nesta história toda, como ele se vê, pois como cineasta, ele não se rende a posições de forma firme, pois o que vale no processo de mudanças é manter a democracia e a dignidade do povo e assim como o personagem poeta, ele não pode ser um artista e um político ao mesmo tempo - dito por Sara (Glauce Rocha), encostada nos ombros largos de Paulo - pois a visão que Glauber oferece é muito mais ampla do que meras posições políticas.

Regido por uma trilha-sonora que tem sons de metralhadoras inseridos de forma ensurdecedora, assim como o esmagamento de um Estado contra seu próprio povo ou a rebelião do povo contra seu Estado opressor. A câmera se assume de forma quase improvisada (assim como o elenco composto por grandes atores como Paulo Autran, Jofre Soares, Paulo Gracindo, Hugo Carvana, Francisco Milani e Flavio Migliaccio), seguindo o pensamento de seu diretor, ele registra e dança com a câmera aonde a ação acontece, sem uso de uma uniformidade na imagem, Glauber ainda assim demonstra todo um cuidado técnico na composição da imagem, mas assumindo de forma inteiramente o espírito transgressor da película, as câmeras não se prendem a toda hora em travellings e carrinhos que dão suporte, a mão é o suporte: a mão do artista.

Terra em Transe é alegórico e forte, expressivo, emprestando influências do neo-realismo e da nouvelle vague. Glauber Rocha sai da estética convencional para começar revolucionando na própria estética, para alçar as mudanças ao mundo afora, a antropofagia do cinema europeu regurgitada em uma realidade puramente latino-americana, em um cinema puramente brasileiro ou como disse Glauber Rocha em uma entrevista para a TV no Festival de Veneza: UM BARATO AUDIOVISUAL!!

*Agradecimentos: Jamile Santos Santana, grande amiga que me contou sobre a comparação que ocorreu entre Barravento e Deus e o Diabo na Terra do Sol, na época do lançamento do último, devido aos contrastes de localidade e que pontua bastante as pontualidades em sua filmografia.

Nota: 10/10




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sexta-feira, abril 11

Sessão Curta+: Tramas do Entardecer (1943)

Filme: Tramas do Entardecer (Meshes of the Afternoon)
Direção: Maya Deren e Alexander Hammid
Roteiro: Maya Deren
Gênero: Drama
Origem: EUA
Duração: 3 minutos
Sipnose: A narrativa do filme é circular, e repete uma série de imagens simbólicas psicologicamente, incluindo uma flor em uma calçada longa, uma chave de queda, uma porta aberta, uma faca em um pedaço de pão, uma misteriosa figura camuflada com um espelho em um rosto, um telefone do gancho e um oceano.

*Dica: aperta no item da lateral do vídeo para expandir a imagem.

Filme:

quinta-feira, abril 10

9 filmes selecionados: sobre A Relação do Ser Humano com a Violência

Por Maurício Owada

O homem sempre se relacionou com a violência, de diversos modos, seja para obter algo, sobreviver, até o ato de pura maldade, de prazer pelo sofrimento alheio. A violência muda o ser humano, seja a vítima ou o agressor, de diversas formas. Ela revela a nossa natureza e transforma ela drasticamente.

Vejam uma lista (aonde falta muita coisa) que demonstra como o ser humano lida com a violência:

9. Guerra ao Terror, de Kathryn Bigelow (2008)

8. Clube da Luta, de David Fincher (1999)

7. Marcas da Violência, de David Cronenberg (2005)

6. Yojimbo, o Guarda-Costas, de Akira Kurosawa (1961)

5. Taxi Driver, de Martin Scorsese (1976)

4. Onde Os Fracos Não Têm Vez, de Joel e Ethan Coen (2007)

3. Tropa de Elite, de José Padilha (2007)

2. Violência Gratuita, de Michael Haneke (1997)

1. Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick (1971)

quinta-feira, abril 3

Crítica: A Origem (2010)


Por Maurício Owada

"O labirinto da mente humana"

Christopher Nolan sempre teve um fascínio em criar histórias que giram acerca da complexidade da funcionalidade da mente humana, como Amnésia (Memento, 2000), seu segundo trabalho em longa-metragem e primeiro sucesso, aonde um homem tinha amnésia a cada momento e a história ia do final pro começo, fazendo o início da história ser todo o clímax, lidando com uma montagem que ajudava imensamente e uma direção que se preocupava bastante em deixar claro para o espectador o que acontece, mesmo diante de tantos fatos inseridos na trama que traziam mais complexidade e isso sempre foi o maior pecado de sua carreira: explicar demais a história. Ainda que seja um diretor que prefira fazer blockbusters com tramas mais inteligentes, o seu medo em não ser aceito causa explicações didáticas a todo momento ou criar personagens apenas para isso.

Filmes como Insônia (Insomnia, 2002) e O Grande Truque (The Prestige, 2006) também sempre lidou com as ilusões da mente, a confusão criada para se criar uma verdade dentro da mente de alguém. A Origem (Inception)é exatamente sobre isso: criar uma verdade dentro da mente de alguém, entrando na mente da pessoa. Seguindo a cartilha dos filmes de assalto, cada personagem tem uma função dentro do golpe que é desenvolvido na trama e antes disso, é apenas a preparação e as explicações de onde atacarão, por aí, alguns servem apenas para explicar, apesar de terem uma função relativamente importante na história, como os personagens de Ellen Page e Joseph Gordon-Levitt.

A história começa com um roubo de informações a partir da mente de Saito (Ken Watanabe), por Don Cobb (Leonardo DiCaprio) e Arthur (Gordon-Levitt) que dá errado devido a uma projeção da mente de Cobb que sempre sabota, resultado da culpa que carrega pela morte da esposa Mal (Marion Cotillard) que se projeta da mente do protagonista. Após o acontecimento, o próprio Saito contrata os dois para ao invés de roubar informações da mente de uma pessoa, inserir uma ideia na mente do filho de um grande empresário interpretado por Cillian Murphy, para que este possa dividir o império do pai após sua morte. Eles contratam Ariadne (Page), a arquiteta, que precisa construir os cenários dos sonhos, descritos como labirintos; Eames (Tom Hardy), o falsificador, que pode se transformar em outras pessoas nos sonhos; e Yusuf (Dileep Rao), o químico, que produz as drogas que possam sustentar os vários níveis de sonhos (sonhos dentro de sonhos).

Se o parágrafo acima parece ser explicativo demais, o filme segue esse método para manter o espectador atencioso com a narrativa, que para os menos acostumados, pode soar confuso e sem noção, mas a questão é que Nolan insere muitas informações que precisa ser processado na hora de entender o que se passa e se isso acaba pencando para o didatismo, se demonstra necessário para a compreensão. Porém, o estilo lógico e matemático do cinema de Christopher Nolan transforma o sonho em algo lógico demais, o que pode fazer fãs do cinema surreal e David Lynch a não sentirem-se tão atraídos, já que o onirismo aqui só se conta pelos objetos impossíveis que são inseridas no cenário como a Escada de Penrose e diversos outros objetos que cria ilusões de perspectiva que trazem um charme único para a direção de arte, que conta também com um cenário muitas vezes modernista e geométrico. Apesar de uma visão diferente do sonho, Nolan cria uma história muito mais engenhosa do que surreal, reforçando todo o seu cinema que vinha fazendo, baseado nos alicerces da lógica.

Conhecido por utilizar mais efeitos visuais práticos do que digitais, deixando-os no mínimo, Christopher Nolan cria uma das sequências mais famosas dos últimos anos do cinema, a luta no corredor no hotel que se passa no segundo nível do sonho, onde Arthur luta contra dois agentes treinados do inconsciente do alvo com a gravidade oscilando para todos os lados, contando com uma coreografia e um trabalho de câmera excepcional, aonde não há um eixo para o diretor seguir. A parceria com Hans Zimmer aqui se mostra ainda mais criativa do que nos trabalhos icônicos em Batman Begins (idem, 2005) e Batman - O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008), que popularizou o estrondo que é usado em todos os trailers de filmes: o "baauumm" (escrito do modo mais porco que já foi visto em uma crítica), utilizando também notas da música Non, je ne rigrette rien, de Edith Piaf (que é usada na sua versão original), alterando as frequências e tempo.

A Origem é um blockbuster com uma pegada mais inteligente, uma trama que exige mais do cérebro do seu espectador que espera ver explosões em meio a tantas pipocas e mudou de certa forma o mercado do cinema-pipoca da época, dando mais espaço pra filmes que buscam uma história mais bem construída, ainda que se percam em explicações e mais explicações (ainda mais os grandes filmes de ficção-científica), mas que chamam a atenção de levar ao público um trabalho mais pautado em um conteúdo pautado em pesquisas científicas, carregadas da boa arte (a música de Piaf, as referências ao Penrose etc), além de demonstrar um diretor que pode ir além da trilogia que ajudou a crescer e ajudou em sua carreira também, revelando-se de vez um cineasta autoral, mas que falta mais um pouco pra ficar polido de vez.

Nota: 8,0/10,0




Trailer: