sexta-feira, dezembro 12

Crítica: O Poderoso Chefão: Parte II (1974)


Por Maurício Owada

"Caminhos semelhantes e destinos distintos
da família Corleone"

Apesar do livro homônimo de Mario Puzo abranger apenas a trama do primeiro filme, o que o estúdio da Paramount esperava era lucrar mais com a saga da família Corleone, ficando novamente incumbido da missão de escrever e dirigir para Francis Ford Coppola. Com um significativo aumento do orçamento e da liberdade criativa, conquistada pelo sucesso d'O Poderoso Chefão. O que o cineasta e autor (que virara roteirista em Hollywood após seu best-seller) montam é um recorte de um pedaço do livro, que conta a história de origem de Don Vito Corleone, mas destacam a condução de Michael no posto de chefe dos Corleone, tendo que lidar com conflitos familiares (nos dois sentidos do contexto da trilogia) e o governo em seu encalço.

Tudo em O Poderoso Chefão: Parte II (The Godfather: Part II) é mais grandioso e mesmo com um tempo maior de duração num excelente equilíbrio do ritmo, através de duas linhas narrativas protagonizadas por Robert De Niro como Vito Corleone jovem e Al Pacino, trazendo um semblante mais sério e sombrio num Michael mais velho e mais calculista do que se transformara no final do primeiro longa. Juntamente, temos atores repetindo seus papéis, mas tendo mais espaço para brilharem, como Talia Shire (que chegou a ser indicada) como Connie, além de Diane Keaton que carrega um semblante sóbrio e deprimido na antes alegre e altiva Kay, assim como o frágil e desorientado Fredo, que rende numa cena magistral de John Cazale, um ator brilhante que o tempo levou tão cedo e que o tornou exclusivo dessa era brilhante que foi a Nova Hollywood e temos Robert Duvall como o advogado e consigliere Tom Hagen, um homem de vários anos na organização cuja própria moralidade se contrasta com a de Michael, seu irmão de criação. Mas Coppola demonstra ainda o afeto a atores de teatro, de onde sairiam performances densas e profundas, adicionando Michael V. Gazzo e Lee Strasberg, duas lendas da arte dramática americana.

O Sonho Americano representado por imagens reforçam o simbolismo da ilusão da "Terra das Oportunidades", aonde o imigrante se depara com uma economia desigual e encontra na criminalidade, o caminho para a ascensão de algo melhor, seja para a família ou para a ostentação. O que torna a trilogia poderosa é a contextualização social e a trama criada pelo cineasta e o autor abrange esse discurso para outras fronteiras, levando Michael Corleone para uma viagem de negócios, acerto de contas e revelações em Cuba, aonde se depara com uma capital que está prestes a ser alcançada pela revolução, que mudou o cenário latino-americano - o telefone de ouro ostentado por Fulgencio Batista numa reunião de negócios, as atrações noturnas que estampam a visão americana do latino-americano como um indivíduo envolto de sexualidade e submissão (algo que Coppola declarou ter sido exagero da direção de arte), os caça-níqueis quebrados e pisoteados pelo povo cubano e os americanos fugindo da ilha diante da chegada da guerrilha revolucionária na capital - , enriquece a metáfora da América que o cineasta enxergou na trama simples de uma família criminosa italiana e profundamente católica, que antes eram o povo oprimido de bairros pobres e depois, ocupavam a posição de chefes mafiosos com influências políticas e judiciárias. As contradições dos valores tridimensionaliza o ponto de vista sobre a obra, seja nas definições de seus personagens ou naquilo que se sustentam, como a religião (que terá maior destaque no terceiro filme) e o governo, que oras se submete a ser corrompido, oras segue o papel de carrasco que mesmo justificado, denota a hipocrisia de um conjunto de homens que apenas visam a aparência externa como via de seus interesses próprios.

Tudo isso citado acima, ganha impacto pela coloração amarelada de Gordon Willis e seu primoroso trabalho com as luzes, na tonalidade mais lúdica da saga de Don Vito à sobriedade das luzes e predomínio de sombras na saga de Michael, deixando evidente o contraste entre os rumos dos dois personagens. A direção de arte ganha com o orçamento folgado, em uma belíssima recriação de um bairro italiano dos anos 20 e o cuidado com os aspectos culturais que servem como alegoria em tela, desfilando a todo momento e expandindo-se na mente do espectador algo além da trama. A montagem primorosa balanceia o ritmo do filme e dá atenção com o desenvolvimento de seus personagens.

Francis Ford Coppola reproduz o que deu certo no primeiro longa, mas arrisca em duas histórias paralelas distintas que contextualizam dois pontos extremos dos rumos de uma família mafiosa, o jogo de traições, intrigas e conflitos internos.

Uma belíssima obra barroca da sétima arte.

Nota: 10,0/10,0





Trailer:

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Aqui é o seu espaço, pode deixar seu comentário, sugestão ou crítica que logo iremos respondê-lo!