quinta-feira, maio 30

Crítica: Laranja Mecânica (1971)



Por Wendell Marcel

"O filme que criou e estabeleceu uma cultura 
cinematográfica, e definiu a obra-prima de um gênio"

Parece uma espécie de Déjà vu a filosofia que Laranja Mecânica (A Clockwork Orange) quer contar sobre a violência dos seres humanos. Apesar de ser uma adaptação do livro homônimo de Anthony Burgess (infilmável), foi somente com o filme de Stanley Kubrick, o qual ele adaptou, que o tema ganhou repercussão no mercado cultural. Na época do lançamento a obra assustou distribuidoras, foi proibida de ser exibida em muitos países e foi elogiada pelos críticos, assim como definhada por outros. Kubrick sabia o que estava fazendo quando resolveu dirigir a incrível e difícil literatura de Burgess. O resultado? A obra-prima de um diretor, e uma das maiores obras representativas da cultura cinematográfica.

A questão da violência naturalizada no filme é interpretada tanto de forma social quanto psicológica. Adentra-se na mente do sujeito sociopata, irado com tudo e cínico com as razões que o levam a espancar, estuprar e colidir com as regras sociais. O Alex de Malcolm McDowell é um ser amoral, que não respeita e desconhece as mínimas e convenientes regras da sociedade. Seu personagem é uma disposição para o que seria hoje o tema de intensas e calorosas discussões sobre juventude, violência e quebra de regras morais, sociais e individuais. Por isso o filme é tão utilizado quando o assunto é violência, aprofundando ainda mais a esfera de sua filosofia, o indivíduo criado pelo âmbito influenciável.

Alex é um jovem infrator que sai com sua gangue nas noites para aterrorizar mendigos, estuprar mulheres casadas e espancar seus maridos; nos intervalos dessas orgias sociopatas, o grupo descansa em um bar tomando leite drogado emergindo dos seios de uma boneca metamórfica. Após as atividades, o jovem líder da gangue volta para casa para escutar Beethoven, cuidar de sua cobra de estimação e se deleitar com as mentiras a fim de faltar à escola, enganar o seu guardião criminal e novamente se preparar para novas aventuras sexuais com quaisquer mulheres que ele sentir necessidade de possuir. No caso, duas!

No entanto, em uma dessas aventuras, Alex, traído por seus companheiros da conceitual ultraviolência, é preso numa casa na qual invadiu, e prazerosamente assassina a dona da casa. É pego fugindo pela polícia. Na prisão, converte-se à religião, e transforma-se numa espécie de aprendiz dos bons e respeitosos costumes, pela influência do padre/pastor/bispo (forever) local. Quando tem a oportunidade de participar de um teste que traz de volta os conceitos morais e saúde mental dos pacientes infectados pela doença social da revolta e da "consciência defeituosa" (o Método Ludovico), agarra a chance de se curar e poder sair daquela teia de repressão psicológica. No entanto, o tratamento que ele passa é bem mais violento que qualquer um de seus atos cometidos anteriormente, que o levaram a estar naquela situação. As sequências do "cinema moral" é fantástica, e a proposta de evidenciar essa cura, no "teatro de tentações", é extraordinariamente eficiente no que concerne identificar, através dos significados da pessoa doente, a devolução, ou reestruturação dos seus conceitos como pessoa pronta a residir no meio social.

Claro, tudo torna-se mais interessante vendo essas sequências acima minimamente relatadas. Os diálogos construídos, a destreza dos ângulos (belamente fotografados), os cortes, a trilha e a magnífica interpretação de McDowell são primordiais para sustentar a proposta do filme. Laranja Mecânica como nenhum outro filme, até então deleta a contribuição do homem como o simples e corrigível culpado de seus atos. Declarar a cura  desses indivíduos por um tratamento dão doloroso quanto, é bem amargurante do que aceitar as disposições que assolam a sociedade de crime e porventura o castigo de suas colaborações em dignificar essas relações de culpabilidade. Muitos outros filmes tentam compreender, como este aqui, essas relações entre crime, culpa e cura (A Outra História Americana (1998), Violência Gratuita (1997), Drive (2011) ?, Clube da Luta (1999)), mas nenhum outro é tão poderoso na forma e na classe de refletir o que a sociedade se tornara diante dos olhos dos próprios espectadores (o Outro). Um filme que faz um belo tratamento das falidas instituições da família, da política, da ciência, da religião e do próprio homem corroborado pelos sentimentos e prazeres passageiros. O mesmo prazer que leva à desconstrução de seu próprio Eu.

Nota: 9,0/10,0




Trailer:



25 comentários:

  1. Eu também 10 pra ele, também sem pensar duas vezes.
    Quando eu estava no primeiro período da faculdade de comunicação o usamos como objeto de estudo em um trabalho sobre a Teoria Crítica, sua trama traz alguns elementos que ajudam a compreender a crítica que os apocalípticos faziam aos meios de comunicação de massa. Afinal de contas o método Ludovica se assemelha ao tipo de doutrinação feito pela mídia, um processo de moralização torto que pode ter consequências desastrosas...

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    1. Viajou um pouco aí camarada!
      A trama é totalmente direcionada à uma Critica ao Behaviorismo. O problema não foi o Método em si, mas o Alex abrir mão do Livre-Arbítrio dele, por uma falsa "liberdade".

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    2. totalmente direcionada?? quem está viajando é voce sr dono da razao. A critica ao behaviorismo pode ser talvez a essencia, mas nem de longe o filme foi totalmente direcionado a isso.Alem dos varios pontos abordados já abordados na critica, o filme destila veneno em relaçao as politicas de manobras de opiniao publica

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  2. acho esse filme tão superestimado...

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    1. Concordo, e a maioria diz gostar sem entender nada só para parecerem "cults" e "cools".

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    2. na primeira vez que assisti em 2005, achei confuso, estranho e pensei: "tá , é dessa porra ae que meu pai, Deus e o planeta tanto falam???" . percebi que o filme tinha um senso profundo de estética e que se propunha a abordar algo de maneira intensa, mas o ritmo e a linguagem foram muito estranhos para mim.Assisti novamente esse ano, e vejo hoje o porque de sua grandiosidade, consegui entender sua essencia e curtir cada cena. Creio que essa obra deva ser vista mais que uma vez e com um bom intervalo de tempo para ser realmente assimilada.Respeito quem pensa que ele é superestimado, pois tinha esse mesmo pensamento até um ano atras.Mas o foda mesmo é falar que curtiu só porque é senso comum.

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    3. esse filme é superestimado pra PORRA

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  3. Nota 10 com certeza. Um ótimo filme que mostra muitos lados do ser humano. A vingança, o ódio, a ganância e etc. E muito bem interpretado.

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  4. Superestimado? Que isso garoto kk.. esse é sem ducida um dos meus filmes preferidos...muito bom...kubrick gênio. ..

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  5. Muito bacana a "crítica".

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  6. hi hi hi there my little droogies

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  7. Eu vi o filme, gostei! Achei muito bem filmado e planejado, rico em detalhes, porém, me resta uma duvida e gostaria que algum aficcionado por Stanley ou apenas por laranja mecanica, me respondesse: Alex esta curado no final do filme, ficou um tempo curado ou nunca existiu a real cura? Ou além disso é o que eu quiser entender? Se aguem responder, agradeço.

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    1. Olha, eu não sou o maior fã do filme, apesar de achar muito bom. Então, Kubrick é Kubrick e já nos deixou com perguntas em 2001 e O Iluminado, mas enfim, na minha concepção ele tá curado. Não que ele se regenerou, mas se curou daquele efeito do método Ludovico, Mas acho que cabe a você rever e tirar suas próprias conclusões.

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    2. Na versão original do livro, há o capitulo 21 no qual Alex percebe tudo o que ele fez foi errado e se arrepende. :)

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    3. Sim, já ouvi falar!! Kubrick muda o conceito de cura, que apenas confirmava a falta de esperança na humanidade que ele tinha e deixa explicito aqui

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    4. Olha esse filme abre um leque de interpretações, porém no final Alex se libertou da falsa cura. Era apenas uma lavagem cerebral, um tratamento onde ele perdia o livre arbítrio. Queria mas não podia.
      No fundo a violência ainda fazia parte de sua essência assim como faz parte de todos os seres humanos.

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  8. Na minha concepção nunca existiu real cura e sim uma forma física imposta para que ele não cometesse atos brutais e imorais. Como o padre diz, não há livre arbítrio, sendo uma "cura" paliativa. E no final do filme, ele volta a ser o que era antes do método Ludovico. Foi o que eu entendi pelo menos hehe

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    1. Eis uma teoria bem interessante. Realmente, a cura não é bem uma cura, mas sim algo que travava biologicamente os atos violentos.

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  9. Ao ver o filme me lembrei da chamada "cura gay" que as igrejas evangélicas andam implementando por aí. Acredito que seja o mesmo método e que em algum momento a pessoa percebe que na verdade aquilo não funcionou. No caso do filme, não curou seu psicológico, apenas fez o físico confundir o psicológico. e a cura na verdade vem do seu próprio psicológico. Ao fim, a meu ver, ele percebe que está curado desse método louco que o implementaram e está livre pra ter sua propria noção de moral e de livre arbítrio, que se fosse um caso real pra mim devria ser acompanhada por um psicólogo, pois na cena em que a psiquiatra o mostra slides ele continua com pensamentos agressivos e apenas uma terapia poderia ajudá-lo a entender esses pensamentos que tem e a decidir que ser pu não parar, ao apenas "minimizar" os efeitos, ficando c isso apenas em seu pensamento, sem agir.

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  10. Esse filme é excelente mesmo.Um dos poucos casos em que o filme se iquala ou até supera o livro.Pena que nâo ganhou nenhum prémio no oscar.

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  11. Perceba q no final do filme, Alex pergunta à enfermeira sobre um suposto sonho q ele teve de alguém mexendo em seu cérebro, como se fosse uma cirurgia. A enfermeira desconversa dizendo q esse sonho é comum em pacientes. Entendi q ele será uma nova marionete do governo. Ele voltou a ser o q era por intervenção de terceiros.

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  12. "o tratamento que ele passa é bem mais violento que qualquer um de seus atos cometidos anteriormente". quer dizer q estuprar mulheres é bem menos violento q o tratamento dele?

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