domingo, junho 2

Crítica: Viva Zapata! (1952)


Por Maurício Owada

"Entre o mito e o homem, Kazan prefere engradecer o homem
e dá a sua humanidade uma áurea mítica"

Biografias de grandes e importantes figuras históricas sempre chegam ao público com uma áurea mítica em volta dos seus protagonistas, os tornam icônicos e é praticamente uma obrigação serem interpretados por grandes atores, vide Lincoln (idem, 2012) e o trabalho oscarizado de Daniel Day-Lewis ou Ben Kingsley em Gandhi (idem, 1982). A mitificação de homens é comum em Hollywood desde que esta obteve uma forte influência no imaginário popular. Houve filmes que já discutiram a questão da lenda em torno de um fato em filmes como O Homem Que Matou o Facínora (The Man Who Shot Liberty Valence, 1962), de John Ford.

Elia Kazan trabalha em cima da imagem e da história do revolucionário mexicano Emiliano Zapata, vivido por Marlon Brando. Já nos primeiros minutos, Kazan nos apresenta quem é Zapata, o único camponês que mesmo humildemente segurando um chapéu para adentrar a sala do presidente, mas com sua firmeza em encarar e cobrar os homens que estão no poder; e Brando já consegue roubar a cena e praticamente o filme inteiro.

Adepto do método Stanislavski, Marlon Brando confere humanidade a um líder rebelde, mesmo que sua imagem seja enaltecida durante todo o longa, pois o personagem é passível de erros e desvios de conduta (Emiliano Zapata é retratado como um homem de fortes princípios, incorruptível) mas ainda temos a admiração por um homem que faz o que faz pelo bem dos fazendeiros e do seu povo, com valores mais sólidos do que a de um homem letrado. Outra grande atuação na obra é a de Anthony Quinn, como Eufemio, irmão de Emiliano, e que possui um conceito de valores diferente a do irmão. Com fortes presenças em cena, Marlon Brando e Anthony Quinn dividem a tela na mesma proporção e na mesma grandeza; histórias de bastidores do filme dizem que ambos os atores, apesar do respeito mútuo entre os dois, tinha uma rivalidade que era alimentada pelo diretor, para ser explorada nas cenas em que os irmãos Zapata entravam em conflito.

O roteiro conduz uma narrativa recheada de excelentes diálogos, a obra traz a tona uma reflexão política, personagens que tinham ideais no começo do filme, se desvirtuam ao longo do caminho quando beneficiados pela vitória da revolução, enquanto Zapata mantém sua integridade e mesmo quando era líder, desistia, pois percebia os rumos que logo descaracterizariam a verdadeira luta por qual defendia. Emiliano disse uma vez que "é melhor morrer de pé do que viver de joelhos", e apesar da tal frase não haver em meio aos diálogos do longa, a essência dela permanece no espírito reivindicador do líder.

Viva Zapata! (idem) é um filme de caráter reflexivo sobre a vida de um homem e sua influência num povo. Mesmo que os registros históricos digam que após a morte de Emiliano Zapata, o Exército da Libertação do Sul, o qual criou tenha se desintegrado, Kazan traz a tese, na fala de Marlon Brando, de que um povo não necessita de um homem que os guie em sua batalha por condições melhores pois este tem seus interesses próprios (mesmo que isso beneficie uma população) e em meio a batalha, os motivos reais podem ser esquecidos em meio a vantagens políticas. Por isso, um povo se torna desestruturado com um único líder e que eles podem lutar melhor e mais unidos sem um.

"Líder forte, povo fraco. Um povo forte não precisa de um homem forte."

Nota: 8,5/10,0





Trailer:


3 comentários:

  1. Excelente texto. À medida em que lia, trechos do filme vieram a mente.

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    1. Realmente um filme inspirador, é interessante como ele não cai no lugar comum de épicos biográficos.

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  2. Bela crítica.
    Elia Kazan é um grande diretor!!

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