Por Maurício Owada
"Fantasia e realidade se confundem em belo drama
sobre a relação do homem com o meio em que vive"
Indomável Sonhadora é o filme do diretor estreante Benh Zeitlin. Conta a história de uma menina chamada Hushpuppy, que mora no Bathtub (banheira em inglês), um lugar miserável em Louisiana, que vive separada da cidade grande (leia-se civilização) por um muro de contenção e junto com o pai, vivem uma vida selvagem sem o uso e a segurança de recursos industriais e comerciais.
A tese que o roteiro de Lucy Albar e Benh Zeitlin defende é interessante, em que ele estuda a estrutura e a definição de civilização, incluindo um discurso ecológico de forma inteligente, sem ser chato e ou adotar um caráter ativista, indo além disso. O filme procura compreender qual o papel do homem no meio que vive, que está acostumado a alterar o curso natural das coisas para suas construções e investimentos. Na narração em off de Hushpuppy, ela diz que seu pai se referia que as coisas devem estar tudo no seu devido lugar e mesmo se um grãozinho se partir, poderá ocasionar uma gigantesca consequência, fazendo uma crítica do que as atividades humanas acarretam ao meio-ambiente.
A civilização e seu conceito é questionado a todo momento, quando mostra pessoas de um lugar sem muitos recursos se juntando para fazer um abrigo após uma grande tempestade, enquanto outras estão em hospitais, desabrigadas e sem saber para onde ir, "peixes que estão fora d'água" como descreve Hushpuppy.
Um cenário selvagem, compartilhado com porcos e galinhas: a visão do filme se sustenta no ponto de vista da personagem principal, a menina, e o enredo conta com um tom de fantasia onde tudo parece grandioso, e ao mesmo tempo assustador, como nós, meros mortais, que parecemos bebês quando estamos fora da nossa zona de conforto e segurança em uma situação onde o mundo parece ruir. E a câmera enfatiza essa visão, seja em closes que detalham vermes em uma folha ou o muro visto de longe destacando as pontas do arranha-céus do outro lado, podendo ser interpretado como o conhecimento da menina, que abrange apenas o Bathtub, o seu paraíso particular que não depende de supermercados e afins para obtenção de alimento, mas sim, apenas da natureza. É interessante ver também como o filme se apega ao fantástico após a catástrofe que inunda o Bathtub, e esse fantástico só sai de papel conforme a gradação de seu amadurecimento.
As atuações de Quvenzhané Wallis (Hushpuppy) e Dwight Henry (Wink) são o destaque no elenco. A menina, aos 9 anos, foi indicada a melhor atriz no Oscar, uma indicação prematura, mas é inegável o talento dela em frente das câmeras, que tinha na época apenas 5 anos.
Adotando um conceito ecológico, através de uma interessante análise antropológica, Indomável Sonhadora é mágico sem ser escapista ou realista sem ser cru e nu. Um excelente trabalho alternativo de um cineasta estreante, e resta esperar que Behn Zeitlin não sofra da "síndrome do primeiro grande filme" (vide Orson Welles e M. Night Shyamalan), quando não consegue mais superar com nenhum outro projeto posterior.
Nota: 8/10
Trailer:
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