Por Kaio Feliphe
É ACONSELHÁVEL QUE A LEITURA DO TEXTO
SEJA FEITA DEPOIS DE VER O FILME
"A consolidação do estilo de Bigelow."
"A consolidação do estilo de Bigelow."
Desde os primeiros
segundos de projeção, Kathryn Bigelow já deixa clara a sua intenção com o seu
novo filme A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, 2012). Antes de tudo,
um aviso: “Esse filme é baseado no relato em primeira mão de eventos reais”.
Aqui, a diretora já deixa claro que o filme não é fundamentado no que é dito
pela mídia, ou o que os militares de alto escalão contam para o povo. Não. Ele
é baseado em relatos. Ou seja, de
quem realmente viveu aquilo, dia e noite. Depois disso, uma pequena introdução
onde não se vê nada, apenas escuta-se gravações de telefonemas das pessoas que estavam nos
aviões sequestrados nos atentados terroristas em 11 de Setembro de 2001. Esses
poucos momentos são a melhor introdução que esse filme poderia ter. Não usa
imagem alguma, apenas as vozes desesperadas diante da morte iminente, clamando
para que algo aconteça e salve a vida deles. Isso causa angústia no espectador,
pois sabemos qual foi o fim de cada uma daquelas vozes, de cada uma daquelas
famílias.
Após dois anos, o
governo já tinha um alvo, Osama Bin Laden. E é a partir daí que o filme
acompanha “a maior perseguição a um homem na história”. Logo de cara, Bigelow
nos mostra como o exército dos EUA fazia para conseguir as pistas que queriam,
utilizavam a tortura. A tortura de seus presos foi uma das características do
mandato de George W. Bush mais criticadas pela política internacional. Mas,
entre os americanos, essas medidas dividiam opiniões. E, por isso, A Hora Mais
Escura causou uma certa polêmica na terra do Tio Sam. As cenas de tortura são
extremamente realistas, o que pode causar incômodo em uma pessoa mais sensível.
Mas intenção de Bigelow com essas cenas é louvável, escancarar o modo sádico
que os militares da época trabalhavam. O problema é a execução. Dan, o
personagem de Jason Clarke, é completamente estereotipado. Ele é o agente
bonitão, barbudo, que consegue as informações que quer, que introduz a mocinha
ao mundo dele e, de certa forma, a protege. Isso o deixa unidimensional, não ajudando na narrativa. Outro problema é a extensão dessas
cenas. A primeira hora do filme é excessivamente longa exatamente por causa
disso. São, aproximadamente, trinta minutos de tortura. Chega um momento que fica
saturado, soando gratuito.
A partir que Dan perde foco no filme, o centro das atenções vai para Maya, personagem
de Jessica Chastain. Fica clara a evolução psicológica de Maya durante a
projeção. No início, ela se incomoda com as cenas de tortura, esconde o rosto.
Porém, aos poucos, ela vai se transformando, ficando completamente obcecada
pelo seu objetivo, fazendo com que toda aquela repulsa suma (ela até coordena
uma sessão de tortura). A causa dessa evolução já foi estudada por Bigelow em
seu último filme, Guerra Ao Terror (The Hurt Locker, 2008). O efeito da
guerra no ser humano e, principalmente, o pós-guerra. O que fazer quando ela
acaba.
(A partir daqui, o texto contém spoilers sobre Guerra Ao Terror. Então, se não viu o filme, é aconselhável que pare a leitura.)
No filme de 2008, o
Sargento William James (Jeremy Renner) amava o que fazia. Amava aquele ambiente
estranho e hostil. Tanto que ele não aguentou viver uma vida normal depois que
voltou pra casa, ele teve que voltar ao seu “habitat natural”. Já em A Hora
Mais Escura, Maya não ama o que faz ou o ambiente de trabalho, ela é
simplesmente obcecada por seu objetivo, ela quer terminar o que começou. E essa
obsessão que chega a ser cega é muito bem representada pela atuação de Chastain.
Segura quando tem que ser, emotiva quando tem que ser e exaltada quando tem que
ser. Mas algumas decisões no roteiro de Mark Boal tiram o brilho do personagem.
A vontade de criar frases de efeito (“I’m
the motherfucker that find this place, sir.”) e cenas completamente desnecessárias
que quebram o clima tenso que Bigelow emprega, como aquelas cenas completamente
non-sense em que ela escreve no vidro
do escritório do seu chefe.
O auge do filme chega
quando, finalmente, é encontrado o esconderijo de Bin Laden. A construção da
operação e a realização em si são um trabalho de direção e montagem perfeito.
Bigelow filma muito bem, construindo uma tensão crescente em cada cena, que
também é ajudado por decisões muito inteligentes dela. O não uso de trilha-sonora
e mostrar a operação com a câmera em visão noturna ajudam a aumentar a sensação
de realidade. Outra decisão muito boa foi que, em nenhum momento, o rosto de
Bin Laden e do ator que o interpreta é mostrado na tela. Até mesmo quando ele é encontrado e morto. Isso
ajuda ainda mais no realismo porque, por mais parecido que o ator seja,
saberíamos que não é ele. Não mostrá-lo faz com que as imagens dele capturado
que vimos na mídia retornem às nossas mentes. Até acreditamos que aquilo é
verdade.
Depois da missão
cumprida, Maya volta para casa. Essa é a sequência mais simbólica do filme.
Maya senta sozinha no avião, o piloto pergunta para onde ela quer ir e ela não
responde. Fica simplesmente sentada, emocionada. Depois da obsessão, ela não
tem mais o que fazer. Sente-se o vazio dentro dela. Uma singularidade em
relação a Guerra Ao Terror. Boal e
Bigelow foram mais “bondosos” com James, porém com Maya foram bem mais
“cruéis”. Enquanto um termina feliz, no lugar a que pertence, a outra não tem rumo,
não se sente completa mesmo com seu objetivo alcançado. Um final bem forte, que
contrasta com os finais mais bonitinhos de outros filmes do gênero.
A Hora Mais Escura não
chega a ser tão bom quanto seu antecessor, mas Bigelow vem construindo um
estilo próprio de filmar dentro do gênero. Um estilo mais frio e real, em que o
homem é mais importante que a guerra ou o seu objetivo. Nesse trabalho, a
diretora cometeu alguns deslizes que não fez em Guerra Ao Terror, o que diminui
o filme. Mas isso não impede dela ser uma das mais competentes da atualidade e
que A Hora Mais Escura seja um bom filme. Não ótimo, como tinha potencial para
ser, mas bem acima da média.
Avaliação: 7.5/10
A Jessica Chastain merecia o Óscar com este filme. Que actriz fantástica! Achei o filme bastante interessante mesmo.
ResponderExcluirSarah
http://depoisdocinema.blogspot.pt
A cena que a Chastain escreve no vidro do chefe não seria para lembra-lo os dias de demora para "estourar" o suposto "esconderijo"????? É non sense????
ResponderExcluirEu acho que Mark é um bom ator e eu quero ver seu novo filme e sua nova série união.
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