Por Wendell Marcel
"Novo filme dos irmãos Dardenne é um drama social e psicológico excepcional"
Jean-Pierre e Luc Dardenne são ambos vencedores por duas vezes do maior prêmio do Festival de Cannes, a Palma de Ouro. Em seu mais novo drama, Dois Dias, Uma Noite, os irmãos reiteram a ideia de cinema próximo da realidade, com planos longos, sem muitos cortes, provocando no espectador a sensação de tempo e espaço no mesmo compasso em que as horas do dia passam, tornando a narrativa fluída um artifício psicológico para acompanhar a jornada de Sandra. É realmente um belo trabalho de cinema.
O filme conta a história de Sandra, uma mulher que durante um final de semana precisa convencer seus colegas de trabalho a votar para que ela continue no emprego, contudo, para isso eles terão que optar em não aceitar um bônus caso ela fique na empresa. Nesse contexto, o texto primoroso dos roteiristas encara a situação econômica e social que a França passa nos últimos anos, e no seu sentido macro, boa parte da Europa. Para Sandra, e sobretudo para o seu marido, Manu, o seu emprego é necessário para que as contas da casa estejam em dia. Por outro lado, a personagem além de ter que enfrentar olho no olho cada colega de trabalho, e tentar convencer cada um a renegar um extra no salário do fim do mês (o que faz "uma grande diferença quando colocar as contas em dia"), ela também precisa superar uma grave depressão que a impossibilitou de continuar no trabalho 3 meses atrás.
Na jornada do fim de semana, enquanto visita um por um dos funcionários na empresa em que trabalha, os Dardenne, através de Sandra, vão apresentando como está constituída a moral dos franceses pós-crise mundial, representada quando as personagens indagam se o outro aceitou votar a favor de dela, e se ela, em um momento de empatia, se colocaria no lugar deles. Afinal, a grande maioria daquelas pessoas possuem mulheres e maridos, e filhos, casa para bancar e etc. As pessoas também poderiam se colocar no lugar de Sandra, que corre o risco de perder o emprego; pois ela também possui uma família. No entanto, Sandra pouco defende essa perspectiva, aceitando facilmente em alguns casos a decisão dos colegas desfavorável a ela.
O diálogo que a protagonista tem com os coadjuvantes é muito bem dirigido, e a competência dos atores e atrizes está fortemente direcionado para essas cenas de enfrentamento. A fragilidade psicológica de Sandra frente à fragilidade econômica e moral do Julien, Kader, Willy e outros. Não podemos inferir ganância dos colegas de trabalho, mas talvez uma certa individualidade com a situação econômica do outrem, nesse caso o de Sandra que, nos intervalos das visitas, tem várias crises emocionais, pensando sempre em desistir, em voltar pra casa e deitar solitariamente na cama. O seu marido, personagem interpretado pelo excelente Fabrizio Rongione, tem importante papel no direcionamento de Sandra para conseguir o maior número de votos para manter-se no emprego. Voto a voto, pessoa a pessoa, "colega" a "colega" Sandra vai percebendo o quão difícil é saber em que momento podemos contar com as pessoas que antes diziam ser nossos amigos. Metaforicamente, os amigos se contam com os dedos da mão, ou com o número total de votos...
É principalmente pelo trabalho de Marion Cotillard, que interpreta o papel de Sandra, que Dois Dias, Uma Noite tem em sua estrutura uma carga dramática que não sofre desníveis em momento algum. A atriz, em confiança com os diretores, desempenha em várias cenas master uma ação dramática incorrigível, dando ao espectador a sensação de que ela está profundamente imersa na personagem. O percurso da ação dramática perpassa os atos até chegar em um clímax que dialoga mais profundamente com os significados retratados no decorrer do filme, aspectos como moral e ética. É Sandra agora o sujeito que será testado por uma decisão; dilema já contado pelos cineastas em outro grande filme, O Garoto da Bicicleta. Sublime!
Nota: 8,5 - 10
Trailer:
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