menos olha"
A primeira cena de A Grande Beleza (La Grande Bellezza) não faz parte da história, tampouco há uma conexão narrativa que é revelada mais tarde, mas mostra já a questão do olhar ao belo, aonde ele realmente está e para onde os outros preferem olhar, quando turistas japoneses passam reto, guiados por uma guia turística, a um grupo de mulheres que cantam em uma construção uma bela música e é claro que nós apreciamos a cena em si, até o momento em que um turista para e olha para algo além, mas a câmera engana e logo vemos ele olhando um monte de construções da capital italiana, Roma, e tira uma foto... minutos depois, ele cai morto sem motivo aparente. Seria spoiler, se fizesse parte da história, mas é importante de qualquer modo pois nos passa todo o conceito do filme e aonde o olhar das pessoas estão direcionadas quando procuram a beleza.
Jap Gambardella (Toni Servillo) é um jornalista que já outrora, foi um grande escritor e relembra de sua juventude perdida, passeando e refletindo entre as ruas de Roma, se regozijando de sua fama pelo livro O Aparelho Humano que lançou décadas atrás frequentando as festas luxuosas e glamourosas da alta sociedade. O passado retorna após descobrir que um antigo amor da juventude morrera e decide voltar a escrever.
Com uma forte influência do diretor Federico Fellini, seja pela estética ao retratar uma alta sociedade extravagante, quase caricatural em festas cheio de luzes e roupas esquisitas, além de uma vasta de gama de personagens interessantes, cada um com suas complexidades, como o próprio protagonista, que apresenta uma personalidade totalmente ácida, mas que tem seus momentos de sensibilidade e a cena na qual ele chora num velório após afirmar que é imoral chorar em um evento desses pois isso seria tentar roubar a cena da pessoa que estaria em luto. Essa busca boêmia pela grande beleza, aquilo que fosse a máxima do belo e do sensível, a paz tranquila ou o que for que seja é o que dá nome ao título, ao mesmo tempo em que reflete sobre a vida e isso lembra muito os devaneios de Guido Anselmi (Marcello Mastroianni) em Oito e Meio (8½) sobre as pessoas ao seu redor e o seu passado que o moldou.
Como o filme acompanha a procura por algo que seja tido como a verdade absoluta, que retrata a inquietação do seu protagonista (ainda que ele não consiga dar o ponta-pé sobre qualquer coisa que queira escrever ou fazer artisticamente), ele demonstra em cenas particularmente críticas, a percepção de pessoas que se auto-consideram intelectuais, em sua maioria da alta sociedade cuja futilidade traz um vazio que procuram preencher em obras de arte pretensiosas ou estúpidas, como a pintura jorrada na tela por uma menina enraivada pelo fato de estar sendo obrigada pelos próprios pais a fazer o espetáculo que traz a ilusão a todos acompanhando aqueles ricos de roupa fina e pseudo-intelectuais como a pura arte e nem a Igreja Católica foge muito disso, enraizada na cultura italiana de forma extremamente profunda, principalmente pela base dela estar localizada em Roma desde a Idade Média, contando com um padre vaidoso que paga de filósofo e uma freira velha e debilitada (um tipo de Madre Tereza de Calcutá) que ainda usa as roupas de quando era menina.
No fim, Paolo Sorrentino demonstra que a grande beleza é subjetiva, se esconde nos lugares aonde a gente menos olha, não é óbvia e às vezes, intelectualizá-la nos prende em grandes bobagens e não é elitizada como muitos ainda acham ser e nem a elite é surpreendentemente inteligente e culta. Seja na arte ou na religião, o ser humano constantemente busca algo que alivie sua aflição perante a vida e a morte, o jovem e o velho, o vazio e o profundo, o resto é tudo blá blá blá...
10,0/10,0
Trailer:
Só por nos fazer lembrar de Fellini o filme já merece nosso respeito, mas ele tem vida própria. Ótima experiência.
ResponderExcluirExatamente!! É um experiência cinematográfica muito boa e quem sabe, pretendo revê-lo
Excluir