Por Maurício Owada
"A personificação da utopia particular de Kurosawa
em Dersu Uzala"
Akira Kurosawa sempre foi um diretor que tinha um discurso bastante humanista, seja do ponto de vista social ou moral, o cineasta japonês tinha uma visão própria de um mundo simples, uma utopia particular que é comum em várias pessoas ao redor do mundo. Ele olhava para os dois lados da moeda, não à toa seu cinema era considerado "ocidental demais" para os seus compatriotas, enquanto por aqui, Kurosawa transpunha a cultura de seu país na tela e dava ao espectador uma visão bela e ao mesmo, retratava o Japão como um país com problemas como qualquer outro. Porém, o seu país não respondeu do mesmo modo pra ela e depois do fracasso de bilheteria de Dodeskaden - O Caminho da Vida (Dodes'ka-den, 1970), não encontrou apoio para continuar a fazer filmes em seu país de origem, assim auto-exilou para a União Soviética e fez um dos seus filmes mais contemplativos: Dersu Uzala (idem).
Baseado no livro autobiográfico de Vladmir Arsenyev, que fez um registro de sua aventura na Sibéria, em uma missão de mapeamento da região e acaba conhecendo o personagem-título, um caçador solitário e supersticioso que se utiliza apenas do meio em que vive para sobreviver, que o guia em meio a missão e assim, se tornam grandes amigos.
Apesar de ter sido filmado na Sibéria, Kurosawa encontra no personagem Dersu Uzala, a personificação de seus ideais, a teoria da vida equilibrada de modo que se utilize da natureza sem destruí-la, utilizando do que tem para não alterar o ciclo natural das coisas, algo que ele reafirmaria anos mais tarde no último segmento de Sonhos (Yume, 1990) (seu filme mais particular). Dersu é a idealização do homem selvagem e simples e toda a obra se concentra no simpático homem cuja baixa estatura simboliza algo aquém das suas capacidades de viver na floresta.
A típica fotografia dos seus filmes, de cores quentes, como se fossem pinceladas por Van Gogh (uma de suas maiores influências artísticas) e toda uma áurea de misticidade na natureza na cena da tempestade, engrandece o cenário belo e hostil da Sibéria.
Mas o que torna Dersu Uzala uma das maiores obras-primas de seu diretor é não só a grande identificação com o homem selvagem, mas a sua filosofia nos faz questionar a vida em que vivemos, movida pelo dinheiro, erguida por concreto que cobre nossos céus e o Sol, com o nosso oxigênio natural trocado por fumaças tóxicas advindas do progresso econômico de uma civilização racional que decidiu trocar tudo isso por uma metrópole enorme e terrivelmente apertada para todos nós, e nem mesmo a floresta consegue dar conta da maldade humana, que cada vez toma conta e com o tempo que o filme passa, percebemos um Dersu cada vez menos habituado a este mundo, que tão cruel se tornou.
Akira Kurosawa sempre adotou uma visão realista da humanidade, às vezes carregava um certo otimismo nela, mas sempre acrescentava uma carga forte de pessimismo no destino de suas personagens, porque no fim, o ser humano que decide o seu modo de vida, o caminho o qual deve tomar e as consequências que elas implicam.
Nota: 9,0/10,0
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