Por Wendell Marcel
"O belo e o feio no cinema pernambucano de Lacerda".
O primeiro filme de ficção de Hilton Lacerda como diretor é uma aventura, uma das mais belas do cinema brasileiro dos últimos tempos. Seu texto mais recente é por Febre de Rato (2012), mas em Tatuagem o estilo absurdamente polêmico está mais evidente, pois é a crítica das críticas para os Estados, os povos e os dogmas que fazem da sociedade um âmbito, a sua vertente mais elaborada. O mesmo rosto de Irandhir Santos (Clécio) permeia esta obra, e seus gestos sutis tornam o ator um dos mais bem preparados da atualidade. O diretor e seu ator são duas ferramentas para atingir o dito Cinema nacional; Tatuagem, assim, é uma transgressão, um soco no estômago, que não dói, mas deixa marcas na memória do espectador que assiste ao filme na sala escura e sai dela impotente, mistificado e encantado. Todas essas sensações ao mesmo tempo e em proporções incomensuráveis.
A quase certeza do filme em marcar o espectador, Tatuagem perpassa a categoria de que está aquém de saboreá-lo com o desdém sobre questões que regojizam a sociedade tradicional, o primeiro será o preconceito de gênero e sexualidade. O longa traduz essas mesmas questões com poesia, com um colorido ensurdecedor e uma música cegante. É a sexualidade no período da ditadura, é o sabor do prazer, do deleite inalienável do sobejo do outro; é uma escolha de Lacerda, imprimir sua narração em personagens tão insuficientemente completos. São eles diversos perfis, e é o teatro de suas vidas a prova cabal disso, tachada na trupe Chão de Estrelas. Nenhum deles possui identidade, por isso são tão belos.
Mas o filme não é apenas sexo gay, não é somente a maconha que provoca o consciente, e não é o poder das autoridades militares que reprime o povo, que trata este objeto. Os personagens são algozes de reivindicações, de todas as incompletas afirmações de uma sociedade que se torna, naquele tempo que passa o filme, uma natureza morta, que passa a renascer das cinzas da ditadura.
A aventura comentada no primeiro momento deste texto é sobre como o diretor leva seu espectador-amante para as sequências mais sensuais e emocionantes desse ano no cinema. Lacerda é aqui um anarquista, um revolucionário, um artista submerso no mundo diferente dos homens, mulheres, travestis e viados que sobrevivem ao Regime. O diretor quebra com a ditadura da imagem, e o corpo, o prazer, o beijo e a liberdade de expressão não possuem mais donos. Além do diretor, os créditos dessas cenas vão para os responsáveis da direção de fotografia e edição, que fazem um trabalho instigante.
A pele, tatuada pela repressão da diversidade do desejo e do amor (o feio), é curada por uma marca da nova impressão do povo (o belo): o mesmo Estado repressor (Fininha, por Jesuíta Barbosa) é marcado pela revolução dos seus. E ele se rende, e se inclina e se torna parte daquilo. Da dor ao riso, da crise ao sabor da mudança, Tatuagem é um dos melhores e mais belos filmes de nossa cinematografia brasileira. Vê-lo no cinema, observando aquele povo todo rindo, chorando, atentos ao espetáculo que é Santos cantando lindamente, amando atrozmente e sabendo viver; sabendo atuar. Eu ri, chorei e me encantei com Tatuagem. Esse é ou não o sentido de toda essa coisa chamada de Cinema?
Nota: 8.5/10
Trailer:
Filme maravilhoso em todos os aspectos.
ResponderExcluirCom pernambucano, fico bastante orgulhoso.
9.0/10
Sim, um filme maravilhoso!
ResponderExcluirO cinema pernambucano está dando orgulho para todos nós.
Abraço
Não achei no site, mas um filme que eu gostaria de ler a Crítica seria "O Som ao Redor", pra mim um ótimo filme, para outros um péssimo filme.
ExcluirGosto muito dessa divergência de opiniões.
Abs